Golden Kamuy: que aventura deliciosa
De vez enquanto o Japão nos presenteia com uma
animação incrível, e Golden Kamuy foi uma dessas gratas surpresas, ou melhor,
uma surpresa deliciosa. Infelizmente a animação não tem todos os recursos
financeiros que deveria ter, mas o roteiro e as personagens são incríveis.
Acredito que o grande diferencial deste anime seja a
sua ambientação. Nos não estamos no Período Medieval com os samurais e suas
katanas, nem em um país contemporâneo com os jovens vivendo aventuras escolares
ou em um Japão do futuro, onde os mechas protegem a humanidade de kaijus. Nós
estamos em um Japão do ínicío do século XX, em plena Era Meiji, especificamente
no Pós-Guerra Russo-Japonesa. Estamos, portanto, em uma temporalidade muito
pouco explorada pelos animes. E é neste contexto que somos apresentados aos
nossos protagonistas. O ex-soldado do exército Sugimoto, o Imortal, que ganhou
este apelido por ter saído de várias situações de quase morte, e Arsirpa, uma
garota ainu (um povo originário do Japão e da Rússia), que salva o militar de
ser comido por ursos na floresta. Ambos desenvolvem uma amizade e juntos
resolvem ir em busca de um suposto tesouro do povo ainu, tesouro este que foi
roubado por alguns criminosos e que leva ao assassinato do pai de Asirpa.
Essa história tem poucos problemas, para não dizer
que não tem nenhum. O maior deles, sem dúvida, é a qualidade na sua animação. Sem
dúvidas Golden Kamuy merecia estar em um estúdio grande e com mais
investimentos, mas apesar dos pesares, o enredo consegue segurar os momentos em
que a animação está horrorosa. O outro problema é que faltou uma recapitulação
no meio deste drama. Felizmente estamos este anime tem muitos bons personagens,
e como tivemos um espaço entre a sua primeira e segunda temporada, demorei um
pouco para lembrar de todo mundo. Tirando os fatos apresentados acima, não
tenho mais nada a reclamar.
No título do texto chamei Golden Kamuy de aventura
deliciosa não só porque as partes de ação da história são incríveis, mas também
porque neste anime isso tem um duplo sentido. Temos várias cenas em que os
personagens estão sentados em torno de uma fogueira, cozinhando e se deliciando
com as maravilhas das culinárias japonesas e ainu. No anime estes momentos em
torno da fogueira, onde todos estão comendo e rindo, são sempre incríveis e
devo dizer que são as minhas partes favoritas da história. Principalmente
porque as personagens estão sendo desenvolvidos e os conflitos sendo
trabalhados. Tudo isso ajuda a elevar a expectativa nos momentos de ação,
porque você sabe o peso das coisas, o que está em jogo, tanto a nível de
aventura como a nível de relação entre personagens.
Outro ponto relevante desta história é a mensagem
que ela quer passar. Em tempos que os imigrantes são vistos como inimigos, que
o diferente é perseguido, Golden Kamuy traz uma bela mensagem de aceitação das
diferenças e de integração cultural respeitosa como caminho para o
desenvolvimento e fortalecimento dos valores humanos. Não disse isso até agora,
mas Golden Kamuy é originalmente um manga escrito por Saturu Noda. E porque
essa informação é relevante? Por que o mesmo recebe o apoio e a consultoria de
um linguista da Universidade de Chiba, chamado Hiroshi Nakagawa, que é
descendente do povo ainu. Ou seja, esta história não tem apenas uma mensagem
sobre integração cultural a se passar, ela o faz da maneira mais responsável e
doce possível, o que ajuda a dar um toque especial no que já é fantástico. A
história nos mantém o tempo todo em contato com a cultura deste povo, da comida
até do folclore. E não é em uma perspectiva colonialista, onde os povos
originários são ajudados por um homem bom da civilização moderna, pois Asirpa é
tão protagonista como o Sugimoto, e da integração dos dois, da integração
destas culturas que surge a força e as capacidades para vencerem os obstáculos
que se apresentam em seu caminho. E não é só isso, não são apenas os ainu que
são retratados, vemos outras culturas tradicionais, com menor tempo de tela é
claro, sendo retratadas nesta história. Alem disso, temos uma crítica a Era
Meiji, como ela destruiu outras culturas locais e tradicionais do Japão em prol
de um nacionalismo que só levou várias pessoas a presenciarem os horrores da
guerra.
Dos vilões aos heróis, passando pelas personagens
misteriosas, devemos dizer que todas são boas. Elas são carismáticas,
tridimensionais e as suas motivações fazem sentido dentro da história que está
sendo contada. Detalhe curioso é a forma como eles são divididos em vários
grupos, onde podemos ver que nem os heróis são tão bonzinhos, nem os vilões tão
malvados. Ambos estão a serviço de seus próprios grupos e interesses. As
alianças dentro destes grupos são momentâneas, o que faz com que você se
encante com todas as personagens e saiba que o amigo deste episódio, pode de
fato, ser um inimigo no próximo, e vice e versa.
Outro ponto positivo desta trama é que o contexto
histórico não é apenas um pano de fundo para o desenvolvimento da mesma, pois
este influencia diretamente nos acontecimentos e decisões das personagens. O fato
de estarmos na Era Meiji, em um Japão com uma forte política militarista e
armamentista, as portas da Primeira Guerra Mundial e logo após o fim da Guerra
Russo-Japonesa são elementos que são importantes para a trama ser como é.
Se você leu este texto até aqui já deve ter
percebido que eu me tornei um fã de Golden Kamuy e quero espalhar a sua palavra
para o mundo. E é exatamente isso, apesar da animação precária, Golden Kamuy
tem uma trama incrível e se você está procurando um bom anime para ver, acho que
deveria dar uma chance para este.





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